quarta-feira, 5 de outubro de 2011

EMOÇÃO

- Iiii, alá... Pré-Mortais! – disse o menino, passando em frente ao estande, agarrado a mão da mãe. Os olhos esbugalhados em uma expressão de admiração pelo livro que indicava.

- O moço, é Bestseller? – perguntou a garota, com o livro Pré-Mortais em mãos, chamando a atenção do autor, que esclarecia as duvidas de outro leitor.

- Já tem o filme, tio? – disse o estudante acompanhado de duas amigas, também uniformizadas, dirigindo-se ao autor, que se encontrava ajeitando a prateleira.

- Caraca, leva! É bom, tenho certeza! – o menino falava de forma entusiasmada para a amiga, enquanto apontava para o livro Pré-Mortais. O detalhe, é que ele não havia se quer folheado a obra.


Essas são algumas das frases com as quais eu me deparei durante a minha aventura na Bienal do Livro 2011.
Foi um momento único em minha vida. Não tenho palavras que descrevam o que senti, diante de cada pessoa que parou no estande. Era incrível ver e observar como cada uma reagia de uma forma diante de um livro que havia acabado de sair do forno. E mais espantoso ainda era o carinho (mesmo que curioso) que os leitores direcionavam a mim, enquanto autor independente (leia-se marinheiro de primeira viagem).
Obrigado a todos que me deram essa oportunidade e que apostaram no meu trabalho. Arriscando ler, a mim, um total desconhecido que caia de pára-quedas naquele mar de livros e que, de alguma forma, chamou a atenção de leitores tão ávidos por emoções que pudessem entreter seu preciso tempo.

Essa nota eu dedico a CADA UM de vocês que passou pelo meu estande na Bienal 2011.
OBRIGADO!!!

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

GELO

Após uma sequência de ensaios "românticos", volto novamente com ação.
Espero que apreciem.

GELO
A tempestade chegou sem avisar. O frio preencheu o ar em pouco tempo, cobrindo de gelo tudo à sua volta. Por sorte, o andarilho estava preparado. Trazia sobre a pele do corpo, a leve, porém quente, capa feita de pele de urso branco. O que o ajudou a não parar diante da força da natureza. Mesmo frente aos ventos gelados, ele seguiu adiante em seu caminho. Conhecia a importância de chegar ao fim daquela estrada, onde o que almejava estaria a lhe esperar.
A caminhada debaixo do frio seguiu por algumas horas. O andarilho mantinha passos largos e firmes sobre o gelo, evitando ser pego de surpresa por qualquer parte mais deslizante. Agora faltava pouco, apenas mais uma descida e ele estaria fora da área mais pesada da tempestade.

Assim que ele se aproximou do pé daquele pequeno desfiladeiro, completando a sua descida, um som cortante chegou sem avisar. Ele parou imediatamente. A mão deslizando sem pensar para o punho da espada que pendia em sua cintura, ficando em prontidão. Os ouvidos atentos ao menor movimento a sua volta. Ele esperou 20, 30, 60 segundos. Nada. Porém, seus instintos lhe precaviam para não baixar a guarda. Ele movimentou a cabeça de um lado a outro, tentando sentir o cheiro que o cercava. Pois uma leve brisa denunciou o odor pesado de alguma fera, que provavelmente o espreitava, se esgueirando com a pelugem encharcada.
O andarilho manteve a calma e continuou como se nada tivesse percebido. Assim que deu o primeiro passo, o vento o avisou com um silvo cortante. Mas antes que o que quer que fosse pudesse lhe atingir, ele desembainhou a espada com destreza e deslizou para o lado, cortando o ar acima de sua cabeça. Sentiu então a lâmina da espada rasgar por um breve momento uma superfície áspera que não sustentou por muito tempo seu encontro com o fio da lâmina.
O guerreiro parou, ainda em guarda, e levou sua espada novamente a bainha.
O vento gritava em seus ouvidos, mas o chiado da fera era mais latente. E agora demonstrava seu rancor por sua presa, que se tornara seu agressor. Mas isso não estremeceu o andarilho. Ele continuou imóvel, estudando qual seria o próximo passo da fera. A mão firme no punho da espada, que agora ansiava por sair novamente para beber mais um pouco do sangue que havia provado. A fera o rodeou, procurando ser o mais silenciosa que podia. Porém, os ouvidos do andarilho eram afinados de tal maneira, que ele poderia ouvir mesmo os passos mais macios a se aproximar naquele terreno. Mas a fera não tinha como saber. E por isso, saltou novamente sobre o homem. E assim que chegou perto, percebeu seu fim chegar pelo aço da espada, que atravessou seu peito, dessa vez, com firmeza. E, antes que a fera terminasse de jogar o peso morto de seu corpo sobre o homem, ele deslizou a lâmina seguindo seu curso e saindo de sua direção. A fera caiu inerte, o corpo sem o menor sinal de respiração. O sangue esvaindo-se na neve.
O guerreiro sacudiu a espada, livrando-a do sangue quente da fera, e a embainhou novamente. Ajeitou a capa de urso sobre o corpo e retomou sua caminhada. Assim ele seguia mais uma vez em direção ao norte, rumo ao seu destino.

domingo, 2 de outubro de 2011

SENTIMENTOS

O garoto parou em frente ao interfone, e ali, por um tempo ficou. Seu olhar fixo em um único botão. Seus pensamentos direcionados para ela. Porém, a indecisão entre fazer o que o coração queria e o que a razão mandava. Ele tirou uma das mãos do bolso, coçou o queixo de leve, por fim, cedeu ao coração. Apertou o único botão que lhe convinha. O de número 504.
- O que você quer? – disse a voz de menina, em tom levemente irritado.
- Você está bem? – o rapazinho perguntou.
- E isso importa? – retrucou a menina, em tom malcriado.
- Para mim, sim. – o garoto afirmou. Havia convicção em suas palavras. – Posso ir ai? – ele acrescentou.
- Você sabe o caminho. – a menina respondeu e se calou.
O menino sacudiu a cabeça, desolado, e se dirigiu ao elevador. Apertou o botão e esperou. Não demorou, o elevador chegou. Ele entrou e apertou o numero 5. As portas de ferro se fecharam e com um solavanco a caixa de aço se deslocou em direção ao andar selecionado.
O numero 5 piscou no painel e as portas se abriram. Calmamente o menino saiu, dirigindo-se ao apartamento da menina.
Foi preciso que ele tocasse a campainha duas vezes até que ela atendesse. Quando a porta se abriu, revelou uma menina de cabelos negros enrolados em um rabo de cavalo improvisado. Ela olhou para o rosto cor de chocolate do garoto e continuou séria. Por alguns minutos, nenhum dos dois falou nada. Mas foi ele quem quebrou o silêncio.
- Não gosto de te ver assim. Fico triste, quando você fica triste.
A garota tentou esconder um riso entre o olhar severo que sustentava no rosto, mas ele percebeu que ela gostou de ver que alguém se preocupava com ela.
- Eu não estou triste. – ela disse secamente. – Só não queria mais ficar no meio daquela gentinha.
-Tem certeza? Não é o que seus olhos me dizem. – ele disse, quando notou que os olhos dela estavam avermelhados. Como os de alguém que estivera chorando.
- Quer saber mais de mim, do que eu mesma? – ela o alfinetou.
- Não, longe de mim. Só estou preocupado com você. – suas palavras eram sinceras. – Mas já que está tudo bem, vou me retirar. Acho que estou apenas tomando o seu tempo. Não quero incomodá-la.
O garoto disse sério, os olhos fixos no dela. Ela se quer piscou.
Ele sorriu sem jeito e se virou, seguindo novamente para o elevador. Assim que ele ficou de costas, ela segurou sua mão. O leve toque dela, fez com que ele parasse instantaneamente. Mas ainda sim ele se manteve de costas para ela, e ficou em silêncio. Ela também nada disse. E assim os dois ficaram por alguns instantes, ligados apenas pelo toque da mão um do outro.
Quando ele fez que ia seguir, dando um passo a frente, ela o abraçou, cruzando seus braços na frente dos peitos do menino. E, de leve, encostou a cabeça na nunca dele. Em seguida, ele sentiu uma gota molhar de leve sua camisa nas costas. Ele não precisou olhar, sabia que ela estava chorando.
- Fica! – ela pediu, agora com a voz gentil.
- Sim! – ele disse tocando de leve as mãos dela, que repousavam sobre seu peito.

DECEPÇÃO

- Boa tarde senhor! Poderia chamar a Lia para mim? – disse o garoto.
- E você, é? – perguntou o homem uniformizado.
- Andino! Diga a ela que é o Andino. – respondeu o garoto.
O homem balançou a cabeça em sinal positivo e saiu. Eu fiquei ali no portão esperando. O coração acelerado, as mãos tremendo e a ansiedade me sufocando. Nem sei como havia conseguido manter a calma perto do porteiro. Esperei por apenas 5 minutos. Mas pareceu uma eternidade.
Assim que o porteiro voltou, já chegou balançando a cabeça negativamente.
- Sinto muito rapaz, ela está em aula e não pode sair. – ele disse.
Eu baixei a cabeça, desolado.
- Mas ela perguntou se você poderia esperar até a hora do intervalo. – o porteiro acrescentou.
Eu levantei a cabeça, com um sorriso tímido no rosto, e fiz sinal afirmativo.
- Então, é só esperar ali, oh! – o porteiro disse, abrindo o portão e me indicando uns bancos no pátio, que ficavam a direita da entrada.
- Obrigado senhor! – eu disse, enquanto me dirigia para a direção indicada.
Fiquei aguardando nos bancos. O tempo parecia não passar. Eu olhava ansioso de um lado a outro, mãos tremendo e o coração a mil. Mesmo com as mãos tremulas, eu não soltava a rosa que trazia comigo e tão pouco o bilhete. Era por causa disso que eu estava ali, esperando a Lia. E enquanto me perdi em pensamentos a lembrar do sorriso dela, fui tragado de volta para a realidade pelo barulho do sinal, que provavelmente anunciava o intervalo.
À vi saindo do corredor. Levantei ansioso.
E agora, o que iria dizer? Havia esperado tanto por esse momento. Quando dei por mim de novo, ela já estava parada a minha frente, com seu sorriso a me oferecer.
- Oi, Andino! – ela me cumprimentou.
Por segundos que pareceram horas, fiquei sem fala. Fui tomado pelo nervosismo e as palavras simplesmente fugiam da minha língua, me deixando sem a menor reação. Mas eu respirei fundo e consegui falar.
- Oi, Lia! – e ainda sem jeito, consegui esboçar um sorriso.
- O porteiro havia dito que você queria falar comigo. Em que posso ajudá-lo? – ela disse com a voz quase inaudível e aquele jeitinho meigo dela.
- É... – eu comecei meio sem jeito, escondendo a rosa entre as mãos, posicionando-as nas minhas costas. – não vim pedir ajuda. Eu vim falar algo muito importante com você. Pelo menos para mim.
Ela inclinou levemente a cabeça, como uma criança curiosa, provavelmente tentando entender as minhas intenções. Mas continuou calada.
- Vim lhe trazer isto! – eu estendi a rosa e o bilheta a minha frente.
Lia corou na hora. Suas bochechas ficaram rosadas, como sempre acontecia quando ela ficava sem jeito.
- São para mim? – ela perguntou, ainda incrédula.
- Sim! – disse.
Ela pegou a rosa e o bilhete, as bochechas ainda rosadas, demonstrando seu desconcerto. Em silêncio, ela leu o bilhete. Eu não havia escrito muito coisa, por isso, logo ela ergueu a cabeça me direcionando um olhar ainda mais desconcertado.
Pronto, estava feito. Agora ela sabia de tudo. Meu coração gelou. O que ela iria dizer? Era a pergunta que martelava em minha mente. Mas agora não tinha mais volta.
- Andino, é muito bonito o que você escreveu. – ela disse, quebrando o silêncio. – Mas... – ela hesitou. Os olhos demonstrando ainda certo desconcerto – me desculpe. Somos apenas amigos.
Meu coração ficou em cacos naquela hora. E provavelmente isso estava transparente em meu rosto, porque, ela tocou de leve minhas mãos e tocou meu rosto, colocando nossos olhos um de frente para o outro.
- Não fique assim. Gostei muito de todas as cartas que você mandou. Nunca imaginaria que era você. – ela disse, e aquilo me alegrou por um instante. Mas ela continuou. – Mas te vejo apenas como amigo. Você é um doce de pessoa, gentil, atencioso, carinhoso, inteligente, esforçado, mas... somos apenas amigos. – ela disse, com um sorriso sincero, meio tímido.
- Tudo bem. - Eu sorri de volta. Não fui exatamente sincero, mas não podia fazer mais nada. Havia perdido meu chão e meus sentimentos estavam em pedaços. Caquinhos bem miúdos, que levariam um século para serem juntados novamente.
- Pode deixar, não vou mais importuná-la com isso. – eu disse, ainda sustentando o sorriso, falso, no rosto.
Aproximei-me dela, dei-lhe um beijo na testa e me afastei novamente.
- Acho que é tchau, então, né? – eu disse.
O Sinal do fim do intervalo soou e foi à afirmação da nossa despedida. Não esperei que ela dissesse mais nada. Virei e fui em direção ao portão. Caminhei sem olhar para trás. Só depois de já estar a uma boa distância do cursinho onde ela estudava, eu parei. E só então, eu levei minha mão ao meu rosto, enxugando a lagrima que havia tomado coragem para sair e escorregava lentamente pelas minhas bochechas.

sábado, 1 de outubro de 2011

PAIS E FILHOS - Silêncio

O garoto caminhava lentamente. Não havia pressa nem mesmo em sua expressão. Seu destino não parecia ser o que ele queria. Mas ele sabia que, de alguma forma, teria que chegar. Era um menino magricela, mas não abaixo do peso. A cabeça era emoldurada por cabelos negros, cortados a máquina. Um garoto comum, porém, diferente pela dor que carregava no coração. A blusa da escola estava suja em várias partes, o cadarço do pé esquerdo do quichute estava desamarrado e ele trazia a mochila pendurada em uma das mãos.
Não havia sorriso em seu rosto.
Ele parou diante de um muro marrom com um portão de madeira. Por detrás deles, uma casa de dois andares se erguia. O menino retirou do pescoço um cordão que trazia três chaves. Escolheu uma delas e encaixou no portão. A tranca destravou com dois cliques. O garoto passou pelo portão e subiu as escadas que levavam ao segundo andar da casa. Ali, havia apenas uma grande varanda e duas portas, que eram os únicos cômodos daquela parte da casa. O garoto parou, suspirou fundo, e olhou ao redor. A paisagem que se estendia era a de várias casas humildes. A única coisa que quebrava a continuidade da visão era a grande igreja que se erguia praticamente a frente de sua casa. Mas nada daquilo o importava. Ele sacudiu a cabeça e enfiou a chave na porta da sua esquerda. Novamente dois cliques e, a passagem estava liberada.
Era um cômodo pequeno, provavelmente seis metros quadrados. Não havia luxo ali. As únicas coisas que preenchiam o espaço eram: uma cama de madeira polida ao fundo, um guarda-roupa na parede da direita, uma mesa com um computador ao lado da janela na parede da esquerda, uma estante com alguns livros, ao lado da porta, e um giro visor sustentando uma TV de 14” logo acima dela. O menino largou a mochila na cadeira e se jogou na cama, com um desanimo estampado no rosto. O mesmo que parecia ter lhe acompanhado o caminho inteiro. De forma despreocupada, ele levou a mão à boca, tocando o pequeno corte no canto dos lábios.
- Por que todos me odeiam? – ele falou consigo mesmo.
Virou de lado na cama, postando-se de frente para a parede, que era o fundo do quarto. Pareceu não se sentir a vontade com a posição, e se mexeu novamente, ficando de bruços e enfiando a cara no travesseiro. Mas sua tentativa de “fuga” foi interrompida quando alguém bateu a porta.
- Posso entrar? – perguntou uma voz de mulher.
O garoto se virou novamente e dessa vez ficou de barriga para cima, olhando para o teto. Seus olhos estavam vermelhos, o rosto marcado próximo aos olhos e o travesseiro mostrava sinal de umidade. Depois de um tempo ele respondeu.
- Sim. Pode entrar mãe.
A porta abriu praticamente sem nenhum barulho. A senhora olhou para o menino deitado na cama e, hesitante, se aproximou. Retirou a mochila de cima da cadeira e a colocou pendurada no encosto da mesma e se sentou.
O garoto ainda permanecia em silêncio.
Ainda demonstrando hesitação, a senhora fez um gesto para tocar o menino, mas parou a poucos centímetros da testa dele. Porém, não se deteve ali, completou o gesto e alisou delicadamente a testa do filho. Que silenciosamente deixou uma lágrima escorrer pelo canto do olho. Mas permaneceu imóvel e não disse nenhuma palavra. A mãe observou o menino, reparando a ferida no canto da boca, a blusa suja de poeira e um pouco de sangue e, o olhar triste e profundo no rosto do filho.
- Quer conversar? – ela perguntou. A voz triste, provavelmente pelo estado em que o filho se encontrava.
O garoto continuou sem dizer nada. Mas levantou da cama calmamente e ficou sentado. Sua mãe também não disse mais nada, apenas esperou. Sustentando um olhar calmo e terno para ele. Observando os olhos vermelhos do filho.
Do nada, o menino enlaçou a mãe pela cintura e se entregou as lágrimas que ainda lutavam para sair.
A mãe apenas pousou os braços sobre o menino, acolhendo-o com seu calor. E eles ficaram em silêncio, juntos. Não havia uma só palavra a ser dita. O menino era assim: fechado. Falava mais com o corpo do que com palavras.